domingo, setembro 10, 2006

Exportação brasileira de felicidade bate recorde


A exportação brasileira de felicidade alcançou taxas recordes nos últimos três anos. Depois de 10 anos depressivos do país, fruto das taxas de juros, lucros de bancos, dois mandatos neoliberais, mediocrização da esquerda, retardo cultural e duas copas do mundo ganhas por acidente. Os números não mentem: *73% dos brasileiros são felizes.

O aumento da alegria interna acelerou a expansão no mercado internacional a partir de 2002 com os crentes no governo popular de esquerda, num país rico, democrático, capitalista e moderno do terceiro mundo. A expectativa era personificada num barbudo operário com a audácia de dialogar com o FMI, fazer a reforma agrária, promover a ética pública, priorizar a educação e combater a homogeneidade cultural. Tudo isso respeitando os acordos internacionais, o direito a propriedade e demais prazeres da classe média. Após uma pequena redução deste público consumidor, que não acompanhou as taxas cobradas, o mercado interno elevou-se com direita renascida após denúncias de corrupção no governo popular. Influenciados por uma classe dominante detentora de royalites em paraísos fiscais, accionistas da BOVESPA fizeram fusões com bancos e agências internacionais movimentando o mercado financeiro.

Com a reformulação da industria cultural, o exotismo do terceiro mundo entrou na centralidade do consumo pop. Nesta zona o futebol brasileiro é líder de mercado ao possibilitar sonhos estéticos instantâneos. Na Copa do Mundo os filhos da elite vão a Alemanha compartilhar com o mundo o que não se vê nem em nossos estádios. O resultado é que dribles e arrancadas não passaram de ilusões de marketing. A TV, Internet e novas mídias digitais construíram um imaginário que só ocorria em campeonatos europeus.

A posição no mercado de felicidade está solidificada com um público especializado: esquerdistas ortodoxos. Não crentes num operário inspirado pelo sindicalismo americano, passam a defender na imutabilidade dos princípios de esquerda. Também são céticos com a social democracia e pacto com burguesia nacional. Apostam em manifestos com intelectuais, bravatas e tratam com indiferença o apoio popular. Negam qualquer reformulação profunda na esquerda e no novo espaço público.

*Dado publicado no jornal Folha de São Paulo, domingo 10 de setembro de 2006.

Pedro Caribé