terça-feira, janeiro 11, 2011

O fim da Era Barradas


Restam imagens esgarçadas da primeira vez que desci no Barradão em 1992, sei que Dão marcou no 1x0 sobre o Remo, na arrancada para retornar a primeira divisão. Já em 1994 lembro de mais detalhes na inauguração das atuais arquibancadas e do sistema de iluminação: com direito a gol de Ramon, 2x0 no Timbú. Sou torcedor do Vitória privilegiado, comecei a acompanhar o time sistematicamente em 1992 com Zé Roberto e Arthurzinho e após a perda dos títulos nacionais (1992-3) e estaduais (1993-4), ambos na velha Fonte, ia para o Barradão crédulo que as montanhas de lixo, povoadas de porcos, ratos, cachorros e família inteiras, iam dar espaço a conquistas mais importantes que o título estadual sobre o Galícia em 1995.

Lembro como comemorei exageradamente o primeiro título da era Barradão. Era certeza de futuro glorioso ao torcedor que percebia as reformas e a higienização do Santuário Rubro-Negro. A sensação de que ali éramos invencíveis foi estimulada pelo surgimento dos Os Imbatíveis, que no ano de 1999 dava demonstrações como empurrar um time mesmo tecnicamente inferior e atrás por 2x0 no placar, aquela moquequinha não parou de gritar e o Vitória virou por 5x4 no Vasco. Ha, perdemos para o Atlético-MG na semifinal, mas a torcida apoiou o time do começo ao fim, prática pouco comum para arquibancadas tachadas de apáticas pelos próprios torcedores naqueles tempos. Ainda era tempo de ouvir o diálogo:
- Senta! Quero ver o jogo.
- Vou ficar em pé nessa porra, se quiser ficar sentado assista em casa!

Passei a não ouvir mais isso atrás do gol que dá para o Flamboyant a partir de então. Mas ao perdemos a vaga na final da Copa do Brasil em 2004, com uma derrota dentro do Barradas, debaixo do favoritismo, um sentimento fúnebre se alastrou por toda Canabrava até sermos rebaixados pela Ponte Preta dentro de casa. Durante a Série B, mesmo com o time mais caro do campeonato, nada empolgava a torcida e alguma coisa me fez evitar o Barradão no 3x3 com a Portuguesa e na perda do título para o Colo-Colo. Só retornei ao Santuário na 2º fase da Terceirona, sabe lá porque, mais apaixonado do que nunca pelo Vitória.

Era o fim da era Paulo Carneiro que se anunciava: a valorização do torcedor. Nem notamos que perdemos para o rival dentro de casa na fase final e subimos no mesmo sono (ou sonho) para Série A e tivemos o gosto de sermos quase imbatíveis em casa nos torneios de 2008 e 2009. Continuavámos a não ganhar do rival em casa. Na Copa do Brasil de 2010 alguma coisa dizia que aquele time limitado ia nos vingar de todos os azares ao levantar o caneco no Barradão. Cheirava a título a forma como a bolava entrou sem méritos contra o Vasco e não entrou, perto do fim, quando estava 2x0 no Atlético-GO.

O Santos deixou nos pés de nossos jogadores o título no jogo de volta. Ha, a primeira final nacional dentro do Barradão. Como era esperado esse dia em cada travesseiro rubro-negro. Tinhamos cânticos de arrepiar qualquer espinha pelo país, um time guerreiro, determinado ao título como nunca antes. Mas aí Schwenck e Júnior foram perdendo gols, o jogo foi correndo... e terminou, com um triunfo para amansar a alma, mas não de levantar defunto. Fomos perdendo e empatando jogos o Barradão até ser novamente rebaixado, pela terceira vez, dentro do Manoel Barradas.

Vai lá que futebol precisa de magia e que em 2011 milagres podem acontecer. Mas sinceramente, não acredito, irei a estréia no dia 16 de janeiro por mera rendição a esse amor vermelho e preto. Não acredito no Barradão, na torcida ou qualquer outra mística que me dê esperança. Nem no título da Série B ou estadual. Vou ao estádio sabendo que desde 2004 Paulo Carneiro já anunciava o fim da Era Barradão. Lembrem que a promessa era uma nova arena na Paralela. Sua loucura, ganância e falhas na gestão humana e financeira foram responsáveis pelas quedas seguidas. Poucos torcedores querem ouvir falar nesse nome, mas é fato que seu lado visionário faz falta na gestão.

Hoje temos uma administração que tornou o Vitória um Naútico, Fortaleza ou Paysandu. É incrível como jogadores debandam do elenco da forma mais desrespeitosa possível. Não temos nenhum projeto que atraia investidores ou sonhos. Os times que detinham os melhores caixas na década de 1990 eram o Criciúma e Paraná lembram? O que representam ambos para o futebol brasileiro hoje? O São Caetano era o modelo de salários baixos e bons resultados nos anos 2000, o que é hoje o São Caetano? Pensamento tacanho esse de Alexi Portela, sanar as dívidas para depois tornar o time vencedor. Essa economia de palito nos fez perder um paliteiro inteiro em 2011, 2012, 2013... ou alguém ainda tem dúvidas dos impactos financeiros do rebaixamento? Mas parece que nada aconteceu entre os Conselheiros que podem estacionar os carros importados dentro do estádio.

Antônio Lopes pode ser campeão do mundo pelo Vitória, mas preferiria um treinador no estilo de Ney Franco ou Dorival Júnior, treinadores capazes de realizar inovações, antenados com o futuro, carregado de sonhos. Alexi Portela se vangloria de ser filho de alguém que dizem ter ajudado muito o Vitória, mas essa elite aristocrática baiana é uma viúva falida que mantém a pose ao tomar café com pães da Favorita com o padre Sadock no Instituto Feminino ou no Museu Carlos Costa Pinto.

O Barradão é um estádio ultrapassado há muito tempo. Seu mérito inicial foi torná-lo patrimônio do clube, apto a colher receitas e estimular paixões. Além disso foi construído numa região recém hiper povoada da cidade, angariou novos torcedores, hábitos e paixões. Hoje o torcedor está cansado de atravessar a cidade engarrafada e ainda ter que enfrentar a letargia das vias de Cajazeiras, Flamboyant, Trobogy ou São Rafael. As linhas de ônibus são promessas vãs, assim como a nova via, prometida pelo prefeito maluquinho João Henrique, parente daquele que deu nome ao estádio (me desculpem os espíritas, mas um parente desse prefeito não merece ter o nome do nosso estádio).

É preciso varrer esses sobrenomes: Barradas, Portela, Tanajura e etc. Se alguma coisa o Barradão nos deixa irreverssível é tornar-se um dos maiores clubes de massa do país e do mundo. Ou vocês acham que o Manchester City tem mais torcedores que o Vitória? É a torcida que nos mantém grande hoje (sei que radialistas e jornalistas são incapazes de tal valorização por comparações indevidas com o rival). Gente no mundo contemporâneo é sinônimo de dinheiro, ainda mais num país de classes emergentes, ainda de hábitos voluvéis de consumo. O Barradão não é um atrativo de lazer pujante, mas decadadente. O sistema de segurança é parco, os estacionamentos, costumeiros nas calçadas, com o retrovisor do carro passando de fininho com ônibus e caminhões de lixo.

O Santos e Corinthians preparam se mudar para estádios próprios em regiões periféricas da Grande São Paulo, sabem bem onde circula o novo dinheiro nacional e que sistemas de metrô modernos resolvem a locomoção. Infelizmente perdemos o bonde, agora só nos resta abençoar a nova Fonte como futura casa. Poderíamos estar hoje com estádio próprio moderno e se duvidar, poderia ser o estádio baiano da Copa. Ha, a insanidade de Paulo Carneiro (PC) o fez meter os pés pelas mãos. Mas ainda há tempo de se colocar a frente da história.

Hoje prefiro que o Vitória seja administrado por uma cooperativa de chineses que detém restaurantes entre a praça da Piedade e o Largo Dois de Julho do que essa aristocracia falida (por favor, não confundam chineses do Centro com um 'nissei' chamado Yamato. sic!). Dizem as más (ou boas?) línguas que PC queria vender o time para árabes, indianos ou russos. Talvez uma figura dessa possa transformar o time vencedor de títulos nacionais com um marketing digno e promessas mirabolantes, como a Cidade Incolor.

Futebol é um negócio internacional vinculado ao sistema financeiro, tráfico, marcas, imagem, signos. Não achem que isso será resolvido com André Curvello, responsável direto pela reeleição de João Henrique, ao estabelescer uma relação duvidosa com os veículos de comunicação locais. Ele é um competente assessor para pensamentos mesquinhos como do atual prefeito de Salvador: "Tome obra, tome obra..."

Ha, enquanto os chineses, russos ou árabes não vêem, lá vou pro lançamento do Movimento Somos Mais Vitória. Quem sabe um pouco de democracia nos retorne para a primeira divisão e a competitividade, pelo menos dentro de casa na Série A. Porque enquanto tivemos como estádio esse Barradas estaremos fadados ao fracasso.