domingo, abril 22, 2012

Rico francês já foge de Hollande

Folha de São Paulo, domingo, 22 de abril de 2012
Rico francês já foge de Hollande
Ameaça de taxar as fortunas com alíquota de 75% leva a uma diáspora para a Bélgica

CLÓVIS ROSSI

 PARIS - No início da campanha eleitoral, François Hollande, o candidato socialista -e favorito para vencer no segundo turno- disse francamente, diante de câmeras e microfones da TV: "Eu não gosto dos ricos". Alguma surpresa com o fato de que está recebendo o troco de seus desafetos, antes mesmo da abertura das urnas? Estão agindo como Mário Amato, então presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, que disse que os empresários brasileiros fariam se Luiz Inácio Lula da Silva ganhasse a eleição de 1989: fugiriam do país em massa. Amato fez apenas terrorismo retórico.

Os franceses ricos não falam, agem. Informa, por exemplo, o jornal belga "De Standaard": "O advogado tributarista Manoël Dekeyser está afogado em trabalho: com a aproximação das eleições presidenciais na França, as chamadas telefônicas chovem desde Paris. Do outro lado da linha, os vizinhos ricos querem saber como fugir com mulher e filhos para a Bélgica". Não estão preparando a fuga apenas pelo desamor que lhes manifesta o candidato socialista. O que os aterroriza é algo muito mais concreto e que dói no bolso, não n'alma: Hollande promete introduzir uma alíquota de 75% no imposto de renda para rendimentos anuais superiores a € 1 milhão (R$ 2,47 milhões). Na quinta-feira, o programa "Enviado Especial" da France 2 foi atrás da informação de "De Standaard" e comprovou que era absolutamente correta: outro advogado tributarista diz que está recebendo de 10 a 20 consultas por mês de franceses que querem emigrar para a Bélgica. A repórter Elise Le Guevel aproveitou para visitar também a Suíça, outro país em que há exilados fiscais franceses. Tentou entrevistá-los em um clube fechado da cidadezinha de Cologny, colada à Genebra e sede do Fórum Econômico Mundial. Logo na primeira tentativa, fulminou-a uma senhora de idade cujo rosto não foi mostrado: "Você não é bem-vinda aqui".

 A fuga dos ricos franceses não é um fenômeno novo: "De Standaard" calcula que essa peculiar comunidade na Bélgica chega talvez a 20 mil pessoas. Mas é um êxodo que foi praticamente freado com a posse de Nicolas Sarkozy em 2007. Afinal, Sarkozy festejou a sua vitória no exclusivo restaurante "Fouquet's" da avenida dos Campos Elísios, no qual os ricos se sentem quase tão à vontade como na Bélgica. Passou a ser chamado de "presidente dos ricos", pelos quais está sempre cercado, mas, neste ano, traiu a companhia: anunciou que pretende taxar os franceses que fugiram do país para pagar menos impostos. A reportagem da France 2 calculou em € 7 bilhões/ano a evasão fiscal decorrente do exílio dourado.

 É natural, por isso, que a campanha eleitoral francesa seja diferente da brasileira: no Brasil, os candidatos enchem a boca para falar (bem) dos pobres. Na França, para falar (mal) dos ricos. Talvez porque os pobres não sejam tantos e nem tão pobres, comparativamente: a linha de pobreza na França é de € 1.852 (R$ 4.580), algo que nem a chamada nova classe média ganha no Brasil.