sexta-feira, dezembro 22, 2017

Qual o problema com o mulato?

O mulato foi e continua a ser problematizado por carregar a conotação etimológica da mula: um equino geralmente estéril devido o cruzamento de raças biologicamente distintas dessa espécie. Mulato no racismo científico é sinônimo de deformação.
Porém, quando Abdias do Nascimento metaforiza o mulato na figura do capitão do mato ele aponta uma disfunção à nível da consciência do indivíduo no mundo. Aquele que rejeita simbolicamente a si, a mãe e aos irmãos para negar a cultura africana, e, em última instância, a sobrevivência do corpo negro.
O mulato e a mestiçagem são compreendidos no âmbito histórico e sociológico por Abdias. No resgate dos dados demográficos ele levanta como o pardo e o mulato foram utilizados para diminuir o número de pretos ou negros nas estatísticas do país. Mas o exercício dele é abraçar à uma realidade comum às diferentes tonalidades da pele entre os mestiços brasileiros.
Tanto que ele influenciou na atual configuração institucional a categoria negro enquanto junção entre pardos e pretos. Um dos poucos legados que conseguiu fissurar o mito da democracia racial nos discursos e no Estado.
Legado combatido por mulatos que carregam a patologia da brancura, como diria Guerreiro Ramos.
Faceta de um genocídio que se perpetua nos disparos certeiros dos policiais militares, e vai além do extermínio, nos aspectos psicológicos, morais e culturais das vendedoras do Bolinho de Jesus.