quinta-feira, julho 30, 2015

Cinzas: onde está a mulher negra?



Exibido pela primeira vez no Latinidades, Cinzas, dirigido por Larissa Fulana de Tal, reconstrói o recorrente debate sobre as relações entre homens e mulheres negras. Adaptado do romance de Davi Nunes, a obra se livra da prisão do feminismo branco, e seus esteriótipos do homem negro: violento, lúdico, ludibrie e, ou, ludibrioso. O cotidiano de um jovem negro em Salvador, "nova classe média", é acompanhado por suas reflexões e irritação.

A casa com geladeira, pintura e fogão novo, não passa de um cubículo. Pega o ônibus cheio, ouve no rádio as notícias sobre a chacina do Cabula. Chega no trabalho, um call center. Salário, mínimo. Não é pago em dia. A chefe branca lhe assedia. Vai para a faculdade, curso nas humanas, se depara com um conhecimento inverossímil.

Onde está a mulher negra? Não apenas na diretora, é a esposa do personagem, ignorada nas suas reflexões, e no mesmo cotidiano opressivo. O monólogo é falso, egoísta. A crítica ao homem negro vai para outro patamar. Falei a Larissa após o filme: "O filme me tocou, mas tenho um segredo que não consigo acessar". Ela explicou sobre o apagamento, e sua inspiração na conversa comum entre as minas. E foi além, muito além: "É um filme sobre relação entre duas pessoas". A diretora e sua obra transcende o véu. Atingem a universalidade negada a nossa experiência.

Parte chave na reinvenção do audiovisual brasileiro esteve presente no Latinidades:  Yasmin Thayná​, Everlane Moraes, Thamires Santos, Viviane Ferreira e Janaína Oliveira. Diretoras, roteiristas, produtoras, pesquisadoras. A sensação é estar sentado na esquina da história, e desta vez não vai ter como silenciar.

A elas e todas as mulheres negras latino-americanas e caribenhas, parabéns. O dia é de vocês.

quarta-feira, julho 01, 2015

30 de junho: um dia de vitória contra o neocolonialismo e racismo



O ponto mais importante na coletiva de Dilma no último dia 30 de junho foi reconhecer que Brasil e EUA têm em comum a experiência com a escravidão. Não se trata de um acaso colonialista, e sim marca na constituição de dois estados-nação. Ambos, só podem discutir qualquer modelo de democracia tendo isso como pedra fundamental.

Por isso, reconhecer a força desta nefasta instituição é chave para desnudar a sincronia entre o neocolonialismo expresso na repórter da GloboNews e o fascismo liderado por Eduardo Cunha na sessão de ontem na Câmara dos Deputados.

No caso brasileiro, é recorrente vir de parcela majoritária das nossas elites uma suposta inferioridade do país, e consequentemente do seu povo. Nessa lógica, somos incapazes para disputar as grandes narrativas históricas. E quem tem que pagar por isso? A ferro e fogo aqueles que são tratados como a fardo do nosso atraso: o povo. Este povo tem cor predominante: preta!

Não por acaso esses discursos retrógrados se exacerbam quando a população negra se organiza de forma mais contundente no país. Enquanto os partidos se dilaceram, e os modelos etnocêntricos de movimentos sociais também, mais uma vez os laços de solidariedade entre a população negra se fortalecem para enfrentar essa ofensiva, e pautarem o discurso no parlamento.

ps: um salve para Orlando Silva (PCdoB-SP) e Benedita da Silva (PT-RJ). eles fizeram os discursos mais comoventes e articulados da noite.